Doença de Huntington

 

        A doença de Huntington é uma doença neurodegenerativa autossômica dominante, de penetrância completa associada a mutações no cromossomo 3. Existem casos esporádicos e familiares, sendo estes últimos mais comuns que aqueles. A doença inicia-se comumente na quarta e quinta décadas de vida, porém existem de início mais precoce, na infância. A duração total da doença, do seu início até o óbito, é de aproximadamente 15 anos. A incidência é provavelmente igual para ambos os sexos.

        É caracterizado por uma tríade de síndromes: extrapiramidal, cognitiva e ­comportamental, relacionadas ao comprometimento dos gânglios da base e de suas conexões corticais.

        A coréia de Huntington é uma doença extrapiramidal que começa de forma insidiosa com alterações cognitivas leves associadas a movimentos involuntários de baixa amplitude e ­alterações de comportamento que variam desde sintomas depressivos e ansiedade leves até psicose grave. A partir daí a doença evolui de forma lenta com piora dos sintomas já referidos, desembocando inexoravelmente numa síndrome demencial completa.

        A síndrome cognitiva é caracterizada por distúrbio precoce da manutenção da atenção e concentração, lentificação do processamento cognitivo, além de distúrbio das atividades relacionadas às funções executivas frontais (planejamento, organização, sistematização), da memória e da linguagem.

        A memória está precocemente alterada, sobretudo nas suas etapas de codificações e recuperação, estabelecendo assim um padrão de amnésia não límbica. Na etapa de codificação da informação estes pacientes se utilizam de estratégias inadequadas, ­determinando posteriormente uma estocagem deficiente e uma evocação/recuperação limitada.

        Caracteriza-se por dificuldades de planejamento, organização e sequenciação, inflexibilidade, muitas vezes assumindo padrões de conduta rígidos e obstinados (por vezes lembrando sintomas obsessivos do transtorno obsessivo-compulsivo), enfim funções que vão interferir sobremaneira no desempenho das atividades da vida diária (AVD), explicando porque estes pacientes têm pontuações tão baixas nas escalas que avaliam as AVD.

        A alteração de linguagem presente também segue um padrão subcortical, com disartria e disprosódia em aproximadamente 50% dos casos nas fases iniciais. À medida que a doença avança, tais alterações levam a uma dificuldade grave de expressão da linguagem: os pacientes perdem a fluência e comunicam-se cada vez menos, com longas latências de respostas e pausas entre frases, seu discurso perde conteúdo e empobrece a qualidade da expressão. Também a prosódia envolvida na compreensão da linguagem pode estar alterada. A disartria, associada a movimentos discinéticos das estruturas do aparelho fonatório (língua, lábios etc.) e aos espasmos diafragmáticos, conferem a estes pacientes uma emissão do discurso característica, explosiva, interrompida abruptamente, eivada de erros fonatórios. Alguns elementos estruturais da fala relacionados a funções corticais mantêm-se preservados, como, por exemplo, a sintaXe, atestando a natureza subcortical das alterações de linguagem. A nomeação e a semântica, também relacionadas ao córtex, estão da mesma forma preservadas.

        Existe também uma síndrome comportamental na coréia de Huntington, tão importante quanto a síndrome cognitiva. Muitos pacientes começam a doença, inclusive, com alterações de personalidade. Um terço dos casos podem apresentar transtornos afetivos ou um quadro que simula a esquizofrenia. A depressão, considerada então um dos transtornos psiquiátricos mais comuns da doença, pode precederas manifestações motoras em vários anos. Automutilações e sua variante mais grave, o suicídio, são frequentes, este último podendo ocorrer em 7% dos casos.

        Movimentos coreiformes involuntários, tipicamente de face, mãos e ombros ou na marcha são manifestações precoces. Eles usualmente precedem a demência e apenas raramente permanecem ausentes até que a demência esteja muito avançada.

        A associação de transtorno coreiforme de movimento, demência e história familiar de ­doença de Huntington é altamente sugestiva do diagnóstico, embora indubitavelmente ocorram casos esporádicos.

        Testes neuropsicológicos que avaliam a atenção, funções executivas, memória e linguagem são especialmente úteis na avaliação das alterações cognitivas mais frequentes da doença.